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Para pensarmos um pouco sobre o CÂNCER

25 de January de 2016

"Bowie não perdeu a batalha contra o câncer
A metáfora militar é ruim. O câncer não é um invasor inimigo e a morte não é uma derrota.
A notícia da morte foi inesperada e chocou muita gente, mas a forma como ela foi dada não surpreendeu ninguém: "David Bowie perdeu a batalha contra o câncer", noticiou a imprensa do mundo todo, e em seguida a frase inundou as redes sociais. Não há surpresa nisso porque essa velha metáfora surrada vem sendo empregada há anos para noticiar mortes causadas por tumores.
Dá para entender porque ela tem tanto apelo. O tratamento de câncer parece-se mesmo com uma luta, de vida ou morte, que deixa o paciente exausto - há mesmo semelhanças com o que um soldado precisa enfrentar num campo de batalhas.

Mas há também diferenças bem importantes.

Para começo de conversa, câncer não é a invasão de um inimigo, como se acreditou por muito tempo. Hoje está bem claro para os cientistas que um tumor não é algo externo a nós contra o qual temos que lutar: ele é parte de nós mesmos, fruto de desequilíbrios nos mesmos processos que nos mantêm vivos. O câncer de fígado que matou Bowie era Bowie também - eram suas próprias células, movidas pelos mesmos genes que geraram sua obra musical ou seus olhos azuis, que perderam o controle de sua reprodução e se transformaram em ameaça. Enfim: tratar um câncer não é como lutar uma guerra. É mais como equilibrar um ecossistema.

Além disso, se formos acreditar que morrer é perder a batalha, isso nos levaria a uma conclusão deprimente: é uma batalha impossível de ganhar. Afinal, nenhum ser humano jamais escapou da mais absoluta das certezas: um dia, morreremos todos. A metáfora é ruim por isso. Soldados, quando vão à guerra, podem vencer ou perder. Já seres humanos morrem sempre, em 100% dos casos. Se a morte é uma certeza, seria absurdo interpretá-la como uma derrota.

O caso de Bowie ilustra bem esse absurdo. Após receber o diagnóstico da doença fatal, um ano e meio atrás, Bowie teve tempo de planejar um novo álbum (Blackstar) e de processar artisticamente as más notícias. Um dos resultados foi a música "Lazarus" e seu desconcertante clip, no qual Bowie zomba da morte e se despede do mundo, numa faixa que provavelmente já entrou para a história da arte. O projeto foi concluído bem a tempo: Bowie morreu dois dias depois de lançar o álbum. Enfim, não foi uma derrota - foi um triunfo artístico final."

Artigo da revista Super Interessante de 13 de janeiro de 2016.

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